Jungjin Lee e suas portas para paisagens fantásticas

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A galeria Camera Obscura é um lugar pouco frequentado pelos turistas em Paris. De frente para a Fondation Cartier, no lindo boulevard Raspail do 14ème arrondissement, a galeria vale muitíssimo a visita. Fundada em 1993 pelo laboratorista francês Didier Brousse, a galeria é especializada em fotografia contemporânea tradicional. As exposições são cuidadosamente montadas. E, em sua maioria, são voltadas para um lado mais artesanal da fotografia: tiragens feitas pelo artistas, P&B, papéis fotográficos com texturas e molduras bem acabadas.

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Mas não se enganem, a galeria não parou no tempo. Alternando fotógrafos renomados, como Sarah Moon, e outros menos conhecidos, Didier gera sua galeria com um olhar para o futuro. Figurinha certa na feita de fotografia Paris Photo, a galeria é um ponto de encontro muito agradável para qualquer amante da fotografia.

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Opening #24, Jungjin Lee, 2015/2016

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Nesse momento, a galeria expõe a fotógrafa coreana Jungjin Lee que vive e trabalha em Nova Iorque. As imagens de Jungjin são em sua maioria paisagens “monótonas”, sem grandes detalhes e sem a presença humana. Imagens em P&B, com muita textura, que emanam uma enorme calma e serenidade.

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Desde sua primeira série, Desert, de 1990, a artista usa uma técnica muito particular de impressão. Ela imprime em um papel coreano chamado Hanji, um papel artesanal de amoreira com bordas irregulares. Suas impressões finais são uma combinação de processos analógicos, feitos no laboratório, e ajustes digitais. No fim, ela imprime a partir do arquivo digital no papel Hanji. Essas imagens são um exemplo perfeito da diferença do olhar ao vivo e na tela do computador. Aqui a fotografia vira um objeto, cheio de detalhes extras do papel, e vê-la frente a frente causa um impacto maior.

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“Enquanto fotógrafa, eu estou principalmente preocupada com o inconsciente, o desconhecido e o invisível.” Jungjin Lee

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Desert, Jungjin Lee, 1990/1994.

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Lee cria paisagens fotográficas culturais e emocionais que misturam técnicas e materiais das tradições orientais e ocidentais, da pintura e da fotografia. Há ruído, superposição, sugestão e há profundidade. Parece que o espectador está olhando através de acúmulos de espaço ou de tempo. E suas paisagens são muitas vezes vistas na vertical, como portas convidando o público a adentrar esses caminhos. E são caminhos que parecem se estender sem fim, numa vastidão de camadas.

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Wind, Jungjin Lee, 2004/2007

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Caminhos, rochas, montanhas, horizontes, monólitos, areia, mar e muito jogo de luz e sombra. Sem títulos ou explicações, suas imagens se resumem a elementos essenciais da natureza. Uma enorme natureza em seus pequenos detalhes que nos envolve. Por isso, mais uma vez, a importância de ver o trabalho ao vivo. Mesmo que seus livros também sejam feitos com muito esmero perpassando na leitura a atmosfera misteriosa e melancólica da artista.

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Esse universo fantástico da artista me parece quase uma viagem ao espírito. As linhas e formas escondidas pelas árvores e pedras nos sugerem uma mudança para vir, ou um monstro pronto para surgir. Ou ainda, nossos próprios devaneios, medos e sonhos que vão e vem em camadas mentais. Portas para o nosso próprio eu.

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Opening, Jungjin Lee, 2015/2016.

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Jungjin Lee – Opening – Ocean até 30 de março na galeria Camera Obscura, 268 boulevard Raspail, 75014.

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2 Comentários

  1. Que beleza sutil e forte tem esse trabalho, Ioana! Fui à Fundação Cartier para ver Geometrias do Sul, mas não imaginava que havia essa galeria de fotografia em frente. Obrigado pela dica. Fica para outra viagem

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