Algumas reflexões sobre o trabalho “Ensaio para avançar ao início*”, da fotógrafa Fernanda Tafner

*Essai pour avancer vers le début, imagem de capa do kit de imprensa ©Fernanda Tafner

.

Nesse ano que nos obriga a rever nosso olhar, e estar sempre se reiniciando de inúmeras maneiras, foi interessante descobrir a série da fotógrafa brasileira Fernanda Tafner: “Ensaio para avançar para o início”. Fruto de uma residência ganha pelo Centre Tignous, em Montreuil na França e feita junto a duas creches francesas, Fernanda resolve relacionar o seu olhar de artista com os olhares das crianças. Os objetos fotografados fazem parte do universo infantil: brinquedos, nuvens, objetos musicais…

Além disso, Fernanda faz uma ponte com o poeta Manoel de Barros e suas poesias sobre a infância. “Eu queria tentar um retorno, como uma espécie de reconexão com esse estado primitivo de existência, tão cara a Manoel de Barros”, relata a artista. Além das fotografias, sua exposição também nos apresenta instalações interativas para ajudar o público a adentrar o universo infantil.

.

foto do kit de imprensa ©fernanda Tafner
foto do kit de imprensa ©Fernanda Tafner

.

Entre fotos feitas em estúdio de objetos recorrentes da creche e imagens feitas em ateliers pelas crianças com a artista, a exposição é colorida, e faz lembrar um jogo de tabuleiro. Vemos bonecos de plástico em grande escala, quase do tamanho das crianças, nuvens para pisar, e caixas sonoras no chão, e se deixarmos entramos facilmente no universo lúdico e sensorial das crianças. Mas é impressionante como é difícil pausar, se despir das certezas, da correria e se deixar capturar.

O que aprendi em livros depois não acrescentou sabedoria, acrescentou informações. O que sei e o que uso para a poesia vem de minhas percepções infantis. – Manoel de Barros

.

Colagem feito pelas crianças com a artista – foto do kit de imprensa ©fernanda Tafner

Em tempos difíceis como estes que estamos vivendo, quem tem o privilégio tem tentado parar, pausar e redescobrir caminhos. O jeito que estávamos avançando não é mais possível, nem hoje e muito menos amanhã. A série da artista Fernanda Tafner ressoou em mim como uma tentativa de zerar tudo – voltar para o início – e procurar outros meios de dialogar com esse mundo de hoje, de uma maneira mais correta talvez. A curadora Angela Berlinde resume bem sobre a série quando diz que a artista ousa criar um espaço onde o imaginário é apresentado como um jogo onde ela se deixa enredar e tenta interpretar os limites entre a experiência e a contemplação. E com ela, “somos convidados a inventar novos começos”.

*a exposição *Essai pour avancer vers le début, de Fernanda Tafner, exposta no Centre Tignous, em Montreuil, deve ter uma bela finissage após o desconfinamento francês.

Continue Reading

Um olhar para além da família

Retratos de família sempre foram um grande tópico na fotografia, ao longo de sua história. Guardamos com eles memórias de nossa infância, de nossos antepassados, das datas felizes que dividimos com pessoas queridas… Mas o que faz um álbum de família impresso no computador ser diferente de imagens de família expostas em museus e galerias? As vezes pouca coisa…

 

Não estou aqui para fazer juízo de valor. De jeito nenhum! Outro dia vi uma entrevista do fotógrafo brasileiro César Barreto na série fotográfica No Olhar muito interessante. Ele dizia que raramente víamos um virtuoso da fotografia, como Mozart foi na música, por exemplo. Porque para ser um bom fotógrafo precisamos construir uma visão de mundo, um discurso em torno da nossa experiência, e isso exige tempo e vivência.

 

Alain Laboile

 

É preciso observar, discutir, tentar e (re)tentar, aprender e (re)aprender.

 

É preciso se emaranhar no objeto, no contexto, na ideia. É preciso ir além do mostrar ou apenas representar. A fotografia vai muito além, ela comunica. Álbuns de família guardados na estante (ou no computador) cumprem uma função maravilhosa. Mas o fotógrafo nesse caso apenas documenta um evento familiar. Ele não fotografa uma visão de mundo, mas apenas uma passagem de tempo.

 

Alain Laboile, um fotógrafo francês, fotografa sua família no interior da França. Pai de 6 filhos, Alain tem muito assunto para retratar. O que vemos em suas imagens é uma presença do seu olhar dentro da imagem. Ele vai além do documento, tirando fotos universais e atemporais sobre uma família. Temas como o crescimento e a infância, são fotografados de forma livre e sincera. Suas reflexões ultrapassam as imagens e se comunicam com todos – objeto, espectador e fotógrafo – questionando liberdade, nudez, ser, amadurecer… A imagem não é mais de uma família francesa, mas de um ser humano, como eu e você. Com seus medos, desafios e sorrisos.

 

 

 

 

 

Continue Reading