Open Call Iandé / PhotoDoc – Rencontres d’Arles 2021

Participante como curadora convidada do open call Iandé/ PhotoDoc com o tema Rituais Fotográficos / Rituais de Resistência, organizado para o festival Rencontres d’Arles 2021, com a participação de quinze curadorxs do Brasil – representando as cinco principais regiões do país e em conexão com os principais festivais brasileiros. Esse olhar curatorial nos permitiu trazer à tona para cena internacional, o trabalho de trinta fotógrafxs.

Eu trouxe para o open call o trabalho de Isis Medeiros sobre a tragédia criminosa das mineradoras na região de Minas Gerais e o trabalho da dupla Rodrigo Masina Pinheiro e Gal Marinelli, “GH”, sobre as inúmeras questões de gênero na nossa sociedade hoje.

Xs 30 fotógrafxs foram projetados na Galerie Huit, em Arles, em um evento durante o festival Rencontres d’Arles.

A comissão de seleção foi composta por Glaucia Nogueira, cofundadora do IANDÈ e curadora, Charlotte Flossaut, fundadora do Photo Doc, Sophie Artaud, diretora cultural do projeto, Julia de Bierre, curadora e fundadora da Galerie Huit Arles e Christine Barthe, chefe da unidade de patrimônio fotográfico do museu Quai Branly.

GH, Gal e Hiroshima ©Rodrigo Masina Pinheiro e Gal Marinelli

Commissaire invitée pour l’Open call Rituels Photographiques /Rituels de Résistance, organisé pour les Rencontres d’Arles 2021, avec la participation de quinze commissaires du Brésil – représentatifs des cinq grandes régions du pays et associés aux principaux festivals brésiliens de photo. Leur regard curatorial a permis de faire émerger les œuvres de trente photographes sur la scène française.

J’ai présenté la série de la photographe Isis de Medeiros sur le tragique crime des compagnies minières de la région de Minas Gerais. Et la série GH, Gal et Hiroshima, de Rodrigo Masina Pinheiro et Gal Marinelli, sur les différents enjeux de genre dans notre société actuelle. Les 30 séries ont été projetées lors d’un événement à la Galerie Huit, pendant les Rencontres d’Arles 2021.

Le comité de sélection était composé par Glaucia Nogueira, co-fondatrice de IANDÉ et curatrice, Charlotte Flossaut fondatrice de Photo Doc, Sophie Artaud, direction culturelle du projet, Julia de Bierre, curatrice et fondatrice de la Galerie Huit Arles, et Christine Barthe, responsable de l’unité patrimoniale Photographie du musée du Quai Branly.

Continue Reading

Shinji Nagabe, a alteridade na imagem.

Falar do trabalho de um amigo é difícil demais. Não sabia até começar esse post. Ainda mais quando esse trabalho é sutilmente elaborado, de maneira forte, eficaz e esteticamente arrebatador. E quando esse tal amigo, chamado Shinji Nagabe, ainda dialoga com duas culturas diferentes. Brasileiro, paulistano de família originária do Japão, Shinji cresceu entre dois pilares culturais.

 

Eu o conheci na época do Prêmio Gávea de Fotografia, em 2016, quando ele ganhou na categoria “imersão fotográfica”. O prêmio consistia em passar 10 dias viajando por Alagoas com o curador Marcelo Campos. Foram 5 cidades visitadas e 750km percorridos pelo estado, onde Shinji desenvolvendo uma nova série. Essa série, Imersão, colocava em cena o desenvolvimento do estado e seu crescimento sócio- econômico ligado ao açúcar. Também desvelava suas paisagens. Mas o foco principal sempre foi sobretudo o ser humano. Mesmo sem mostrar o olhar das pessoas, Shinji representa o humano e toda sua complexidade identitária cultural. Em seu trabalho, Shinji não precisa escancarar os rostos para perpassar a história daquela pessoa, ou daquele povo. Ele o faz de forma sutil mas não menos imponente.

 

Shinji Nagabe, Pescador Dourado, Imersão, 2016

 

Shinji Nagabe, Mulher chora açucar, Imersão, 2016

 

Contra uma crença bastante difundida, a fotografia não é um meio transparente de ver. Configura diferentes pontos de vista envolvidos no mundo.

 

De seus rostos escondidos, sufocados até pela realidade, pela história, pelo cultura, transparecem cenas imaginárias. Além disso, com a ajuda de acessórios ele cria fantasias: chuva de açúcar, guerreiros de capa dourada ou máscara prateada, lanças de cana de açúcar… Porém, para mim, esse primeiro olhar imaginário logo é suplantado pela realidade nua e crua que escancara, em suas imagens, a história humana. Uma história cheia de angústias, frustrações e sonhos. Na série “Imersão” vemos a história dos povoados de Alagoas, sua colonização através do açúcar e seu caminho ao esquecimento. Surgem questionamentos ao redor da construção de identidade dessas pessoas, suas raízes, sua cultura comum e sua realidade. Contudo, são retratos pensados de maneira discreta, doce e lúdica. Talvez à maneira japonesa.

 

Suas cores fortes, e os detalhes pensados junto com as pessoas de cada região, são mais obviamente ligados à cultura brasileira. Vemos dourados que refletem a luz do sol, ou a água dos rios, laranjas, flores fluorescentes, paredes coloridas. Os retratos de Shinji, e seus adereços, abrem um diálogo para além do retratado. Falam tanto do fotografado quanto do artista e sua origem bi-cultural. E falam também do observador, perpassando conceitos, histórias, relações e tempo.

 

Shinji Nagabe, Elevacão, 2015

 

Talvez por causa de sua bagagem oriental, talvez por suas influências ocidentais, sua trajetória pessoal, ou um pouco de tudo isso junto, Shinji problematize no seu trabalho fotográfico inúmeras questões que vão além da fotografia. Permeando a filosofia, a realidade, a religiosidade, a história, a identidade, ele nos leva a explorar outros alicerces da imagem fotográfica. A fotografia é uma linguagem e como tal constrói representações e comunica, transformando a realidade e sendo por ela transformada. O olhar fotográfico, a partir de Shinji, pode nos levar a novas possibilidades de pensar e perceber a nós mesmos.

 

“Não é, em última instância, uma imagem de algo, mas é antes uma fotografia impossível – a fotografia de uma idéia”. – Kerry Brougher 

 

Hoje Shinji vive na Europa, sendo um estrangeiro inserido em outra cultura. Dizem na psicologia que é somente diante do outro que reconhecemos nossa identidade. Talvez esse seja o processo pelo qual Shinji passou e passa. Foi preciso para ele se perder no outro, para então se voltar para si e procurar entender a sua origem. E sua origem nos perpassa.

 

Shinji Nagabe, Purificação, 2016

Shinji Nagabe, Respiração, 2016

 

*A exposição do prêmio Maison Blanche, ganho por Shinji Nagabe este ano de 2018, acaba dia 09 de novembro em Marseille. Endereço: 150 Boulevard Paul Claudel, Marseille.

Continue Reading