Fim de ano chegando, festas, amigos, familiares e brindes, muitos brindes, para renovar a esperança e as energias. E nada melhor que brindar com espumante e champagne. Ainda mais quando conseguimos junta-los com a fotografia.
Restrita a uma pequena região na França, o champagne movimenta em torno de 3 bilhões de euros por ano vendendo a idéia de luxo e celebração. Mas antes de tudo o champagne é um vinho excepcional, de caráter e com propriedades complexas que misturam frescor e tradição. A produção do champagne é uma forma de arte que foi desenvolvida ao longo de séculos através de várias gerações de especialistas. Hoje, sua produção é regulamentada e conta com regras pré-estabelecidas que delimitam desde os tipos de uva a serem usados até o método de fermentação.
Só bebo Champagne quando estou feliz e quando estou triste. Ás vezes, bebo quando estou sozinha. Quando estou em companhia, considero obrigatório. Bebo um golinho se não estou com fome e bebo quando estou com fome. Caso contrário nunca toco nele, a não ser que esteja com sede. – Lily Bollinger
Famoso por seu gosto efervescente, as borbulhas do champagne nos lembram grandes celebrações. Agora, graças aos avançados instrumentos científicos, dois pesquisadores foram mais longe e resolveram estudar o movimento das bolhas de uma taça de champagne. E um novo mundo se revelou. Cientificamente, o estudo vai além dos vinhos pois em menor escala se assemelha a fenômenos análogos ao da atmosfera e do oceano e pode ajudar em diversas áreas da ciência.
Mas para nós, o que importa aqui é a incrível parafernália que Gérard Liger-Belair e Guillaume Polidori desenvolveram para tirarem fotografias inéditas da dança desse vinho único.
Graças a uma abordagem inicialmente cientifica conseguimos descobrir muito sobre os processos sutis que dão a este vinho lendário um brilho ao olhar e um frescor à lingua. E, através de imagens lindas e intrigantes, também se revelou uma outra representação de uma bebida milenar.
Inspirada a pensar sobre arte e física pelo ótimo professor Lucas Sigaud nas aulas do PróSaber, no Rio, sobre arte, educação, filosofia e estética, resolvi escrever algumas considerações.
Ciência e arte são considerados mundos opostos. De um lado a ciência poderia ser definida como uma tentativa de explicar a natureza, e a arte seria mais uma interpretação desse mundo. Porém física e arte vão além, ambas perpassam seus limites e lidam com questões filosóficas da humanidade que acabam aproximando-as. Entre estudos exatos e considerações estéticas importantes, o resultado é: descobertas nas duas áreas que enriquecem a linguagem e a interpretação de ambas e que nos ajudam a lidar com o mundo a nossa volta.
A fotografia, desde o tempo das lanternas mágicas passando pela câmera obscura, estaria mais vinculada à ciência do que outras artes: na engrenagem dos aparelhos de fotografia, no filme colorido, nos jogos óticos das lentes. É uma mídia muito diferente da pintura ou escultura, ela só existe por causa da ciência.
A invenção da fotografia baseia-se num equívoco estranho que tem a ver com sua dupla natureza de arte mecânica: o de ser um instrumento preciso e infalível como uma ciência e, ao mesmo tempo, inexato e falso como a arte. A fotografia encarna uma ”arte exata” e uma ”ciência artística”, o que não tem equivalentes na história. – Francesca Alinov
A fotografia é uma mídia derivada da técnica – lente, foco, distância, fonte de luz, papel de revelação, retoque – e assim, uma foto não é somente a conseqüência de uma impressão do referente na foto, é também uma interpretação das propriedades técnicas da câmera e de seus aparatos. Um filme Kodak vai ter características técnicas diferentes dos filmes Fuji, limitando uma certa leitura sobre as cores, por exemplo. O verde da fotografia de paisagem vai ser um símbolo do verde das matas que vivenciamos, apenas uma leitura técnica inserida no espectro possível de verdes do filme padronizado.
A relação da fotografia e ciência passa pela temática também. A fotografia vai mostrar beleza na ciência, aproximando-a da arte. Muitos artistas aproveitam as descobertas da física para criarem suas obras, como as teorias espaciais que estiveram em alta no século XX. Quando a física mostrou que o universo era muito maior do que imaginávamos, questões existenciais como “qual o nosso papel no universo?” surgiram e se estenderam às artes. Ou os seres microscópios, a eletricidade, as nuvens, o movimento, o som, tudo isso já serviu de tema para a fotografia estreitando os limites entre as duas áreas.
O artista alemão Christoph Keller é um bom exemplo do estreitamento entre arte e ciência. Formado em física, matemática e hidrologia antes de entrar na faculdade de arte, Keller dialoga com as duas áreas, arte e física, e faz isso, inúmeras vezes, através da fotografia.
Em 2011, fez uma exposição no Centre Pompidou chamada “Éter, da cosmologia à consciência”. Seu projeto expunha vídeos, fotografias e textos que lidavam com a questão: o que somos e para quem nos comunicamos? Para o artista o “aether” discute o conceito do desconhecido. Desde Platão, passando por Descartes, Newton, Pointcaré e Kant, o éter sempre apareceu como um conceito elusivo nas ciências e na filosofia.
Na filosofia representa a ausência de ausência, isto é, a impossibilidade de conceber o vazio. Na ciência representa um elemento e um meio, incapaz de mudança e mais sutil do que a luz. O éter é também o quinto elemento, que não tem qualidades e, por definição, nunca poderia ser exatamente concebido nem fisicamente comprovado.
A proposição do “aether” para a exposição é pensada como uma metáfora para o desconhecido. Onde estamos e de onde falamos? Sem dúvida, um dos desafios da arte, e da ciência, hoje é tentar responder essas perguntas. O éter é o vazio, o inominável que está ao nosso redor. – Christoph Keller
Numa exposição artística, o conceito de éter é usado com licença poética para dialogar com o conceito de desconhecido, da comunicação da arte e da posição do homem diante do universo. Entre sua base científica e artística, Keller aproxima os dois universos de maneira ambígua e polissêmica para dialogar, discutir e somar.