Mulheres na fotografia

Já falamos de mulheres e fotografia aqui antes, e as disparidades de gênero no nosso meio. Dia 2 de setembro de 2018, um grupo de fotógrafas publicou uma carta no jornal francês Libération para o diretor das Rencontres d’Arles, Sam Stourdzé, um dos maiores festivais de fotografia. As fotógrafas reivindicam apenas o básico: mais representatividade. De 49 edições do festival, 47 tiveram diretores homens, o total de mulheres artistas exibidas por edição não ultrapassa o total de 20%. E esse ano, de 15 exposições oficiais do festival, 13 eram homens, e apenas 3 mulheres.

 

Esse exemplo é francês mas está arraigado pelo mundo. No Brasil, ano passado, mulheres fotógrafas também se revoltaram contra a pouca representatividade de um grande festival no estado do Rio de Janeiro. Foi bom, porque abriu os olhos dos organizadores que chamaram mulheres para comissão e que esse ano abriram o Festival com uma fantástica fotógrafa mexicana, Flor Garduña, e concluíram com a fotógrafa Maureen Basilliat. O Paris Photo também apurou seu olhar este ano e escolheu o trabalho da fotógrafa negra Mickalene Thomas para ilustrar a capa e cartazes de sua edição 2018.

 

Mickalene Thomas, Lição de amor, 2008

 

O argumento é sempre o mesmo: que eles não se preocupam com a pessoa do artista mas com a qualidade das imagens. Que os perversos somos nós. Mas que coincidência, no final da seleção, eles se deparam apenas com artistas homens. Imagens de si mesmos. É um espelho no qual eles se olham e se admiram. Mas ao remover o espelho de suas mãos, o que sobra é o real impacto de suas práticas sobre os artistas. O que é necessário entender é que o caminho que o trabalho artístico de uma mulher tem que percorrer até a mesa de seleção do diretor de um festival, ou de uma galeria, para poder ser selecionada, é muito mais tortuoso do que o de um homem. Infelizmente, não há exagero nesta afirmação mas experiências vividas, testemunhos e análises sociológicas.

 

E a palavra para definir isso tudo está no dicionário: descriminação!

 

Em mais de 150 anos, houve um grande número de mulheres fotógrafas – conhecidas em seus dias – que desapareceram completamente da cena. Houve um processo lento e poderoso de invisibilização dessas mulheres pelos homens. – Marie Robert, curadora do Museu D’Orsay 

Flor Garduño, Mulheres Fantásticas, 2007

 

Falar é necessário: quebra o silêncio e os antigos paradigmas, muda o status quo e trás um novo pensamento e mudanças estruturais. E gritar um pouco também faz bem! E para mudar é tão simples, basta começar. Expor mais artistas mulheres, em igualdade. E não basta inventar exposições e prêmios femininos específicos, isso só aumenta o problema. Não podemos nos contentar com espaços limitados de representação que continuam contribuindo para a separação da produção artística por gênero. É uma saída a curto prazo, uma tentativa valida mas que não atinge a raiz do problema. 

 

O público quer novos nomes, novos olhares, as artistas tem condições e qualidade artística de sobra, o mercado virá atrás rapidamente. O que falta? Apenas os homens agirem e sairem de seus argumentos narcísicos*.

*Sam Stourdzé nunca respondeu às mulheres.

 

 

Continue Reading

Vamos falar sobre mulheres e a imagem?

Durante o mês de junho, o Centro Cultural Correios, no Rio de Janeiro, está com uma programação bem interessante de debates sobre as mulheres e a imagem. Mais do que interessante, uma discussão necessária!

Já rolaram três mesas até a publicação desse post. Dentre elas, uma sobre o processo de criação e identidade da YVY- mulheres da imagem, em que fui mediadora. Não sou uma pessoa muito politizada, ou melhor, sou muito politizada, mas nunca consegui sentir o lado mais espiritual da política. Sinto na arte, e na fotografia, e acredito que com a arte podemos melhorar o mundo, e ajudar a democratização.

 

Nova logo – YvY, mulheres da imagem

 

A mesa que participei foi bastante interessante, por vários motivos. Normalmente, em debates ouvimos mais sobre o resultado e menos sobre o processo. Essa mesa foi muito cativante pois focou no processo de criação, de organização, nos propósitos em discussão, as dificuldades e os anseios em pauta. Através de inúmeros depoimentos de mulheres presentes me surpreendi e me envolvi na busca por algo maior, por um sonho ideal e coletivo de igualdade e justiça. Pela primeira vez, entendi a política como um caminho também espiritual.

 

Um sonho? Sim. Mas que elas estão trabalhando muito para tornar uma prática. Vamos nos juntar?

 

Os três pontos que mais me chamaram atenção foram:

  1. uma organização horizontal. Diferente da organização vertical tão difundida na sociedade patriarcal, porque não tentar uma outra alternativa mais igualitária e criativa.
  2. o discurso pela representatividade. Apesar da mesa em questão não ter muita representatividade, o projeto quer e procura mais representatividade de mulheres, e pessoas que se identificam enquanto mulheres, de todo o Brasil.
  3. A arte como arma de luta coletiva através da melhor arma que temos: a imagem.

 

Mais informações sobre ações e encontros da YVY – mulheres da imagem no facebook.

Abaixo a programação completa do ciclo de debates do FotoRio, Mulher em Foto:

Cada mesa acontece de 17 às 19h, no Centro Cultural dos Correios, Rio de Janeiro.

 08/06: Fotógrafas brasileiras na foto de 6 Nov 2016 – com Andreas Farias, Bruna Prado, Luciana Macedo, Simone Marinho e Wania Corredo – Mediação: Marcella Marer.

09/06: YVY – Mulheres da Imagem – Organização: Marizilda Cruppe, com Bárbara Cunha (PE), Claudia Ferreira (RJ), Flávia Correia (AL), Isabella Lanave (PR) e Maíra Cabral (MG) – Mediação: Ioana Mello.

10/06 – Débora 70 – “Trajetória” e Fernanda Chemale – “Rastros d’Eus” – projeção com debate – Mediação: Cristina Zappa.

13/06: Fotógrafas Pretas – com Fernanda Dias, Lita Cerqueira e Valda Nogueira (Imagens do Povo) – Mediação: Thaís Rocha.

20/06: Mulher, fotografia e história – com Maria do Carmo Rainho, Thereza Bandeira de Mello e Mariana Muaze – Mediação: Silvana Louzada.

22/06: Fotografia pública e as mulheres – Ana Maria Mauad (LABHOI / UFF)

27/06: Fotógrafa: Rua, Polícia e Comunidade – com Jussara Paixão (fotógrafa da Polícia Civil), Márcia Foletto (O Globo), Thaís Alvarenga (Coletivo Negras[fotos]grafias) – Mediação: Silvana Louzada.

29/06: Relato de Experiência com Claudia Ferreira – fotógrafa, autora dos livros: Mulheres em Movimento e Marcha das Margaridas.

Continue Reading